Mais turmas do EJA para menos analfabetismo no Brasil

Mais turmas do EJA significa menos analfabetismo

O país só não consegue reduzir significativamente o número de analfabetos, por causa da falta de oferta de turmas do EJA.  Especialistas são unânimes em afirmar isso.

Todo o longo trabalho de alfabetização que consiste inicialmente em fazer o adulto aprender a juntar as letras, formar palavras, ler frases e escrever o próprio nome  estará perdido se o aluno adulto não continuar estudando em turmas de educação de jovens e adultos (EJA).

A professora da Universidade de São Paulo (USP) Maria Clara Di Pierro, especialista no tema, avalia que o escopo das políticas de educação de adultos no país ainda é muito limitado. A oferta de educação para jovens e adultos é obrigação do Estado e responsabilidade de estados e municípios, segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), conforme artigo intitulado “Falta de continuidade de estudos é problema a ser combatido”, escrito por Amanda Cieglinski e publicado na Agência Brasil:

“As políticas de alfabetização ainda estão muito apegadas ao modelo de campanha e nós não conseguimos articular bem a alfabetização com a escolarização. A aquisição da leitura e da escrita não é um processo fácil, que se consolide em prazos curtos de seis meses”, aponta a professora. Para ela, falta motivação de estados e municípios para dar prioridade à EJA.

Segundo o secretário de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do Ministério da Educação (MEC), André Lázaro, em muitas localidades em que não há oferta de EJA, adultos que já sabem ler e escrever se matriculam em turmas do programa Brasil Alfabetizado para continuar estudando. Para Lázaro, o fenômeno explica em parte o fato de o esforço empregado pelo programa não se refletir em uma redução real das taxas de analfabetismo.

“O cidadão procura uma turma do programa para não perder o que ele aprendeu. Ou seja, ele responde no censo que é alfabetizado, mas vai para uma turma de alfabetização. Não é o foco do programa, mas essa é uma porta que você não pode fechar”, diz.

Em 2009, o Brasil Alfabetizado tem 1,5 milhão de alunos cadastrados, em cursos que duram até oito meses. Entretanto, como muitos dos que participam não são de fato analfabetos, mas pessoas com poucos anos de estudo e dificuldades para ler e escrever, não é possível calcular que ao final do ano o Brasil terá 1,5 milhão de analfabetos a menos.

Se você conseguisse colocar efetividade em 60% desse total, já seria um grande avanço. O meu desafio agora é dar efetividade ao que está combinado com estados e municípios [de garantir a conclusão e a continuidade dos estudos]”, afirma Lázaro.

O modelo de alfabetização de curto prazo, sem garantia de continuidade pelos estados e municípios, é o principal problema das diversas campanhas de mobilização para erradicar o analfabetismo que o Brasil já implantou. Alguns exemplos são o antigo Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral), nas décadas de 60 e 70, e o Alfabetização Solidária, do governo Fernando Henrique Cardoso.

Para o professor Osmar Fávero, da Universidade Federal Fluminense (UFF), o Brasil Alfabetizado incorre no mesmo erro. “As campanhas se mobilizam muito, gastam muito dinheiro, mas sem o sucesso efetivo das pessoas alfabetizadas”, avalia.

É como chuva de verão: você faz algumas coisas, talvez até alfabetize um certo número de pessoas, mas anos depois vem outra campanha que faz a mesma coisa. As pessoas saem de uma campanha e entram na outra. Você não tem a solução do problema, que seria secar a fonte do analfabetismo garantindo escola de qualidade para todos”, completa o especialista.

A pesquisadora Vera Masagão, da organização não governamental Ação Educativa, também afirma que o trabalho da alfabetização se perde sem a continuidade.

“O coração da política para redução do analfabetismo deve estar na expansão da rede de EJA. O Brasil Alfabetizado é um momento mobilizador para a pessoa se reencontrar com as dinâmicas da aprendizagem, mas a complementação da alfabetização vai se dar na escola mesmo.”

A especialista Maria Clara Di Pierro afirma que, sem a oportunidade de continuar estudando, os analfabetos saem dos programas de letramento ainda analfabetos. “A pessoa não consolida a aprendizagem, ou adquire habilidades muito reduzidas. Ela persiste na condição de analfabeto: sabe reconhecer algumas letras, escrever algumas palavras, mas enfim, ainda é uma situação de analfabetismo”, alerta.