Vida saudável pode vencer genética na luta contra obesidade, diz médico

Cirurgião Orlando Pereira fala sobre obesidade mórbida, que cresceu 255% entre
a população brasileira nas últimas quatro décadas – Foto: Wilson Dias/Abr

Brasília – Apesar do fator genético ser a principal causa da obesidade, especialmente em seu grau mais elevado (obesidade mórbida), os hábitos saudáveis de vida, como alimentação pouco calórica e a prática de atividades físicas, são capazes de impedir a manifestação da doença.

A avaliação é do cirurgião gastroenterologista, Orlando Faria, membro da Câmara Técnica de Cirurgia Bariátrica do Conselho Federal de Medicina (CFM). De acordo com ele, mais de 200 genes condicionam a obesidade, que pode se manifestar em diferentes fases da vida, como após o parto, no caso de mulheres que ganham muito peso com a maternidade, ou na puberdade.

Segundo Faria, a importância da predisposição genética para o ganho de peso é variável entre as pessoas obesas e tende a ser mais significativa naquelas que atingem Índices de Massa Corporal (IMCs) muito altos e que têm histórico de sobrepeso desde a infância. Para elas, a herança genética pesa mais do que os fatores comportamentais, ambientais e emocionais que também estão envolvidos na doença, mas, mesmo nesses casos, é possível neutralizá-la adotando uma vida saudável desde cedo.

“A obesidade tem um componente genético importante mas ele vai se manifestar mais ou menos dependendo do ambiente que a pessoa vive. Se for um meio ambiente de escassez de alimentos, mesmo que a pessoa tenha a predisposição para ganhar peso, ela (predisposição) não vai se manifestar, mas se a mesma pessoa for colocada num ambiente com excesso de oferta de alimentos, muito calóricos, sempre à mão, bastando abrir a porta de uma geladeira, e que não tiver de fazer muita atividade física para viver, certamente ela vai ganhar muito peso” afirmou.

Para o médico, a condição genética favorável à obesidade, que pode ser observada por exemplo em pessoas de famílias com vários obesos, não significa uma predestinação à doença e sim um estímulo ainda maior para usar alimentos nutritivos e balanceados, além de evitar a vida sedentária. “Não é porque tem um componente genético que a pessoa tem de aceitar aquilo. Se tiver hábitos de vida saudáveis, essa parte genética não vai se manifestar”.

Como exemplo da importância do meio, Faria citou o caso das mulheres negras americanas, um dos grupos com maior incidência de obesidade do mundo. Segundo ele, embora suas ancestrais tivessem a carga genética ligada à doença, não apresentavam o problema na África há centenas de anos, já que o ambiente de escassez e de esforço para obtenção do alimento não permitia. Nos Estados Unidos, no entanto, os traços genéticos foram somados a um ambiente favorável ao ganho de peso com excessos calóricos e o conforto da vida moderna.

O médico explicou que a facilidade para ganhar peso é um mecanismo de defesa do organismo para se defender contra períodos de escassez de alimentos, já que sua única forma de armazenar energia é por meio do acúmulo de gordura. Ele destacou que, nos primórdios da humanidade, o mecanismo serviu para garantir a continuidade e a seleção natural da espécie, mas o ambiente natural vem tornando-o nocivo e isso precisa ser alterado.

“Tem mais de 5 milhões de anos que os primeiros hominídeos apareceram na Terra e são 100 anos de revolução na agricultura e de oferta excessiva de alimentos. Ainda menos tempo, 30 anos, de alimentos mais calóricos ainda, maior facilidades de produção industrial e da vida moderna. São milhões de anos contra 30 anos em que ambiente se tornou ruim para esse armazenamento” afirmou. E acrescentou: “Na atual conjuntura médica, não temos como modificar a parte genética, mas podemos tornar os ambientes mais saudáveis. Essa é a única maneira de coibir essa epidemia de obesidade que está ocorrendo no mundo inteiro”.

Adriana Brendler
Repórter da Agência Brasil