Falta de políticas públicas favorece consumo excessivo de álcool pelos jovens, diz especialista

São Paulo – Dificilmente haverá uma inversão na tendência atual dos jovens de beberem cada vez mais cedo e em maior quantidade, afirmou o secretário de Dependência Química da Associação Brasileira de Psiquiatria, Marco Antonio Bessa. Para quem, a falta de políticas públicas é um agravante do problema. Consultado pela Agência Brasil, o Ministério da Saúde não detalhou quais seriam as estratégias de prevenção ao uso de álcool no Brasil.

“Esses números [de jovens que bebem] vem aumentando no Brasil. A tendência está se consolidando. Nós não temos nenhuma perspectiva de melhora porque não existe nenhuma medida efetiva do governo” disse Bessa em entrevista à Agência Brasil. Segundo ele, atualmente o consumo de bebida alcóolica, em média, começa por volta dos 12 anos de idade. Há 20 anos essa iniciação ocorria aos 16 anos.

Para a professora de Serviço Social da Universidade Federal de Pernambuco, Roberta Uchoa, os jovens estão bebendo mais cedo em função da mudança nos padrões de sociabilidade. “As formas de sociabilidade e de ocupação do tempo livre estão cada vez mais submetidas ao mercado”, afirmou.

Roberta Uchoa, que é doutora em sociologia das drogas, disse que existe uma pressão social para o consumo desenfreado. De acordo com a pesquisadora, a indústria vem estimulando o consumo relacionando-o ao prazer e à diversão. “Nesses últimos 20 anos os jovens vem sendo estimulados a consumir qualquer coisa o tempo todo. Os jovens são alvo das indústrias em geral e particularmente da indústria de bebidas alcoólicas”.

Ela chama a atenção para o incentivo ao consumo em grandes quantidades, ainda que ocasional, nas propagandas. “É muito difícil para um jovem distinguir em uma propaganda de televisão, com aquelas figuras em que eles se espelham fazendo farras homéricas, e no final aparece [um aviso de] ‘beba moderadamente’. Há uma dupla mensagem do que seja beber moderadamente”, afirmou.

Esse tipo de ingestão excessiva, aponta Raquel Uchoa, coloca o jovem em risco. “Seja dirigindo um carro, seja atravessando a rua como pedestre, os nossos jovens estão se colocando em situação de risco”, disse.

Outro problema causado pelo álcool, segundo a pesquisadora, é que a embriaguez também leva o jovem à prática de sexo sem proteção, com a possibilidade de contrair doenças e levar à gravidez indesejada, “A gente sabe que quando bebe a gente relaxa no nossos cuidados nas atividades sexuais. Deixa de usar a camisinha, não se toca se está ao período fértil ou não”, afirmou Raquel Uchoa.

Para Marco Antonio Bessa, os jovens, alterados pela bebida, estão mais propícios a praticar e a sofrer violência. De acordo, com ele, muitos dos casos de estupro são praticados por garotos bêbados contra meninas também embriagadas. Além disso, segundo ele, com a diminuição do senso crítico os rapazes e as moças ficam mais suscetíveis a usar outras substâncias além do álcool. “O fato do jovem consumir a bebida alcóolica diminui o seu senso crítico, diminui a sua capacidade de raciocínio, e ele fica muito mais vulnerável à experimentar outra droga”, afirmou.

A busca por sensações mais intensas é outro fator, de acordo com o especialista, que torna a bebida um caminho para o uso de outros entorpecentes. “Então, é por isso que o álcool funciona como um fator de altíssimo risco para o uso de outras drogas. Existe ainda o fator ambiental: os traficantes já estão nos lugares onde eles consomem álcool oferecendo outras drogas”. (Agência Brasil)